quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

15 ANOS

Recostada na cabeceira da cama, com o coração disparado pela ansiedade, ela aguarda a noite chegar. Ainda é cedo e só lhe resta esperar que o tempo seja generoso e passe logo. Seus longos e lisos cabelos castanhos estão enrolados, embalados em mechas, e isso a impede de sair e até mesmo limita seus movimentos. Enquanto espera, viaja pelas páginas de um livro que chegou em suas mãos nem sabe como. É sobre um pássaro que decide fugir aos padrões de sua espécie, decide voar mais alto, ainda que sozinho, e aproveitar de coisas que seus amigos e parentes desconhecem por não ousarem sair da zona de conforto.
Enquanto lê, a menina vislumbra as cenas, sente o cheiro do mar, ouve os sons das gaivotas. E viaja. Imagina-se rompendo barreiras, conquistando novos horizontes, ambientes ainda não explorados. Em sua mente, vive situações, experimenta novos sabores, sente o perfume dos lugares, das pessoas. Imagina-se estudando em uma boa faculdade, namorando um príncipe encantado, escrevendo livros de poesias, filhos, sucesso, felicidade. E viaja...
As horas custam a passar, as pessoas entram e saem a todo momento, alvoroçadas na organização da festa que acontecerá logo mais, conversam alto, riem. Mas nada imterrompe o sonho da menina, imaginando-se adulta,  linda e bem sucedida. Afinal, é isso que significa fazer 15 anos, não é? O ritual de passagem da menina que se tornará moça, pronta para a sociedade. Deixará as bonecas para planejar seu futuro e sua família. Deixará as brincadeiras para trabalhar. Deixará a sapatilha para calçar os sapatos de salto alto. Deixará de sonhar para começar a viver seus sonhos.
"Se o destino é o infinito, o caminho é nas alturas." A menina lê isso e imagina-se vivendo isso. É esse o destino que deseja, é isso que vai buscar. Seus olhos brilham, encantados com o leque de possibilidades que se abrem à sua frente. E como o pássaro da história, ela voa, voa alto, voa longe.
Posso te ver pela janela, menina, no auge de sua beleza e formosura, em sua mais tenra juventude, em seus sonhos mais puros. Também posso ver seus segredos e seus medos, inseguranças, incertezas. Posso vê-la nesse quarto, ansiosa, sonhadora. Posso vê-la agora, que o tempo já passou depressa demais, muito mais do que você poderia prever.
Linda debutante, assim como o pássaro, você vai descobrir que voar alto não é fácil e dói. Você vai sentir o peso em suas asas, o cansaço chegando, a fadiga tomando conta. Também irá perceber que muitas vezes o céu é de bronze, e que a queda de um vôo que parecia tão maravilhoso pode deixar marcas dolorosas.
Ouça o que o pássaro te diz, menina. "Não se preocupe em tomar uma decisão certa... pois ela não existe".
Contudo, não desista de sonhar, não desista de buscar, não deixe de voar.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

SEGUINDO

Olhando para trás ela não consegue acreditar que tenha chegado até ali. O caminho não foi nada fácil, e boa parte dele também não foi agradável.
Pés feridos pelos espinhos no caminho; joelhos esfolados pelas inúmeras quedas; mãos calejadas pelo peso da bagagem que carrega; olhos inchados e molhados por lágrimas de amarguras, tristezas e decepção.
Ela não está caminhando agora. Decidiu para um pouco, descansar. Não consegue dar mais nenhum passo e nem sabe ainda para onde ir. Bebe um pouco de água buscando algum alívio. Não tem forças para continuar. Nem vontade. Por isso está sentada à beira do caminho, embaixo de uma pouca sombra que encontrou. E assim, olha para trás, para o caminho que já passou.
Os sons que a faziam dançar com as borboletas estão tão distantes que já nem podem ser ouvidos. Tudo agora é silêncio e o sol não aquece como antes. As flores são raras, a beleza pouca.
Lembra-se dos atalhos, dos caminhos tortos, dos espinhos que deixaram cicatrizes, dos buracos que a derrubaram, da dificuldade de seguir, de retornar, do medo do incerto, o arrependimento, o choro. Ainda agora, lembrando de tudo o que passou, sente seu coração disparar apertado, consegue sentir novamente toda a dor vivida nesses momentos, nesse trecho do caminho.
Esforça-se para lembrar das flores, do perfume agradável, das músicas alegres, das danças, das promessas. Mas as imagens que lhe aparecem são confusas e embaçadas. E os sentimentos bons que esse trecho do caminho lhe causou não passam de uma vaga lembrança.
- Engraçado como a dor devora a alegria - pensa consigo, esboçando um sorriso amarelo. Não há ninguém para compartilhar esse pensamento, nem o sorriso.
Olha para o chão e deixa escapar uma lágrima solitária. Não consegue chorar tudo o que tem vontade. Apenas uma única lágrima tímida cai aos seus pés, manchando a terra seca.
Ela sabe que precisa continuar, mas não quer. Não sente vontade de seguir em frente, mas não pode voltar atrás. Tenta olhar para o caminho que ainda lhe resta, mas não consegue defini-lo. Seus olhos estão cansados e não enxergam além de poucos passos. Seus pés estão feridos e se recusam a caminhar. A bagagem é pesada, mas ela não consegue simplesmente abandoná-la. A bagagem está em seu coração e sua mente.
Com pouca vontade e muito esforço, levanta-se. tenta ajeitar o vestido rasgado e sujo, sacudir a poeira da estrada. Ergue a cabeça em direção ao caminho incerto e desconhecido. Espera que haja surpresas boas e agradáveis, quem sabe até flores, ou talvez um fruto doce e cheiroso. Talvez seja melhor não esperar muita coisa, pois assim não se decepcionará novamente.